DISCOS: MOTÖRHEAD (BAD MAGIC)
MOTÖRHEAD
Bad Magic
UDR; 2015
Por Lucas Scaliza
Não faz muito tempo, Lemmy Kilmister precisou cancelar uma turnê. O médico disse que estava na hora de ele parar de viver a vida heavy metal que levava. Ele disse que ia pensar. Este ano, no Brasil, durante o festival Monsters of Rock, Lemmy não pôde se apresentar por motivos de saúde. Sofreu distúrbio gástrico e desidratação [leia a resenha do festival AQUI]. Agora ele usa um desfibrilador no peito para manter o batimento cardíaco regular. E este ano, no Glastonbury, a banda terminou de tocar “Ace of Spades” e iniciou “Overkill”, mas ele continuou cantando a primeira. Foi um lapso, ele justificou depois. Estaria este distinto dinossauro do rock com seus dias contados? Ou pelo menos com a carreira perto do fim, obrigado a se aposentar compulsoriamente?
Pelo jeito, Lemmy Kilmister está em um carro com motor envenenado dirigindo por uma planície. Ele sabe que lá na frente há um precipício, mas ele não se importa. Assim como sua banda é famosa por tocar alto, sempre alto, ele pisa fundo no acelerador. Se é assim, que assim seja, ele pensa. Vai ser rock’n’roll até o fim, não vai arrefecer e nem mudar seu estilo de vida.
Pelo menos, é isso que parece que Lemmy está fazendo ao ouvirmos Bad Magic, o novo disco do Motörhead, que está empolgante e bad ass como sempre, divertido e forte. A voz de Lemmy, rouca, é a única coisa que nos lembra a idade do vocalista. De resto, nenhuma das faixas do álbum deixa entrever problemas de saúde ou preocupações com o fim – seja da vida ou da carreira.
Em dezembro, um dia antes do Natal, ele vai completar 70 anos. Embora o Motörhead comemore 40 anos de existência em 2015, a carreira musical de Lemmy chega aos 50, se contarmos o lançamento do primeiro LP de sete polegadas de sua primeira banda, The Rockin’ Vickers. Bad Magic é o 22º álbum da banda que é conhecida principalmente pelo clássico “Ace of Spades”, mas que tem muito mais o que mostrar. O novo álbum, aliás, não reinventa o heavy metal, não traz flertes com o eletrônico, não muda nada no som de uma banda que não é conhecida exatamente por ser inovadora. Mas mesmo assim, o que o Motörhead entrega são 13 ótimas músicas, 13 razões para ouvir o trabalho do começo ao fim repetidas vezes, 13 poderosos lembretes de que Lemmy está vivendo agora sua melhor fase na música.
Se você já conhece o Motörhead, já sabe o que vai encontrar em Bad Magic. Se não conhece, saiba que não falta energia, distorção e vigor na banda. O baixo Rickenbacker de Lemmy continua fazendo as bases competentes de sempre. O guitarrista Phil Wizzö Campbell mais uma vez destila power chords cheios de grave, riffs bem diretos e um bom senso absurdo para solar. O sueco Mikey Dee, na bateria, é um monstro do ritmo e nunca baixa a guarda, fazendo você até querer dançar.
Por isso, nem é preciso descrever as músicas neste texto. Vamos apenas dizer que um senhor cool como Lemmy faz músicas tão empolgantes quanto o Foo Fighters, sem firulas e com a força de um Black Sabbath. Os temas também são aqueles velhos conhecidos do rock setentista e oitentista, já anunciados nos nomes das faixas: “Victory or Die”, “Thunder & Lightining”, “The Devil”, “Evil Eye”, “Teach Them How to Bleed”, “Tell Me Who to Kill”, “Choking on your Screm” e a ótima “When the Sky Comes Looking For You”.
A surpresa do Motörhead fica por conta do cover para “Symphathy for the Devil”, dos Rolling Stones. Mickey Dee recria a percussão tribal e Wizzö coloca mais distorção na guitarra. A voz de Lemmy cai muito bem à faixa e, apesar de soar mais agressiva do que a original, ainda é muito fiel a ela.
O que o Motörhead mantém firme é, sobretudo, sua pegada. As músicas soam como rock clássico, mas anabolizadas por captadores mais musculosos, pedais ruidosos e uma pose de rockstar motoqueiro que dão todo o ar metaleiro da banda. Não é a toa que o grupo era para ser o equivalente inglês, lá em 1975, dos MC5, a clássica banda de Detroit que também era pesada, distorcida e cheia de riffs poderosos. Bad Magic é só mais um capítulo disso. Lemmy é um sobrevivente dos excessos do rock, da mesma estirpe que Ozzy Osbourne e Keith Richards. E assim como esses dois, Lemmy diz que só a morte vai pará-lo e que não largará a música “contanto que possa andar do fundo à frente do palco sem uma bengala. Ou mesmo se eu tiver que usar bengala”, como o mesmo declarou ao Guardian. Só nos resta dizer "amém".
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