Discos: Nove Zero Nove (Blindado)
"Blindado"
Independente; 2016
A Nove Zero Nove é uma das bandas mais atuantes da cena rock carioca. Quem acompanha o corre dos caras, sabe que não falta engajamento, e muito menos honestidade na proposta. O reflexo disso pode ser sentido de perto nos shows ou nas redes sociais. O grupo possui uma crescente legião de seguidores, que vem ajudando na conquista de degraus importantes. Seja votando neles como a melhor banda de um festival (Rio Banda Fest), ou participando de uma campanha para financiar o primeiro disco full da carreira.
Podemos dizer que Blindado é um disco que representa a resistência de uma classe artÃstica, que triunfa a cada dia nos becos e esquinas de rock do Brasil. Em um paÃs onde dizem que o rock morreu, este disco é um soco no estômago da hipocrisia e do oportunismo pessimista que nos assola. "Happy End", que abre o disco, é um exemplo de que o rock vence quando há espontaneidade de espÃrito. Porque para ser rock, você não precisa obedecer padrões. Tem que ter alma. Tem que ter tesão. Ouça as guitarras dessa faixa. Atente a letra. Isso sim é ter o que dizer, e dizer. A Nove Zero Nove o faz - e de forma convincente.
Escute "Mendigo", música seguinte - já conhecida entre os fãs da banda, mas que continua indispensável no roteiro. "Correm avenidas, meu refúgio é delirante, constante / A minha fé já se perdeu / Entrelaçado com o pouco que restou / Da sanidade eu tento me livrar de quem eu sou", interpreta Kyann de forma brilhante. Aliás, essa desenvoltura do vocalista é um dos pontos altos do trabalho. Ele expõe com muita facilidade as mensagens do grupo - seja numa pegada mais rap, no despojamento ou na gritaria. Lembra Rodrigo Lima (Dead Fish) em alguns momentos, lembra Cazuza - nos primórdios do Barão Vermelho - em outros, mas não soa cover de ninguém. Isso pode ser visto de forma evidente em "Cova Rasa", de poesia rara nos dias de hoje: "O mundo morreu quando eu ia me matar / Morreu antes do meu enterro / Não sobrou nem pó nem chão".
Mas a Nove Zero Nove não é só discurso e poesia. Todas as músicas de Blindado possuem um trabalho instrumental coeso. "Temporal" é uma das melhores. A faixa, que começa nas guitarradas abafadas, ganha força na bateria firme e desenvolta de Rafael Cabral e na levada da baixista Eliza Schinner, terminando em um ótimo trabalho melódico. "Roleta Russa" também mantém essa pegada, mas segue conservada pelo bom trabalho de guitarras da banda. Já "Nova Alvorada" tem uma sonoridade mais ambiente, à la Deftones, com guitarras mais esparsas e melodia retrô. Talvez a única que se distancia um pouco da cartilha noventista do álbum é "Uma Noite Dessas", de violões e versos abertos. Mas a gritaria volta com tudo na ótima "InvencÃvel", que encerra o disco de forma precisa. A sonoridade do álbum também chama a atenção. Mas não é por menos. O disco foi produzido pelo renomado Paulo Jeveaux (Barão Vermelho, Nando Reis) e passou pelas mãos do fera Ricardo Feghali (Roupa Nova).
Blindados por sua arte e perseverança, a Nove Zero Nove conseguiu provar que nenhum obstáculo vivenciado, por maior que tenha sido (como por exemplo, o incêndio no apartamento do vocalista MaurÃcio Kyann) foi capaz de obstruir o caminho da banda. Por isso, podemos dizer que Blindado é um disco inabalável no conceito artÃstico e indispensável na sua essência. É para ouvir no mais alto volume.
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