Devotos celebra trinta anos de carreira na contundência de "O Fim Que Nunca Acaba"
Após seis anos sem gravar, Devotos está de volta com novo trabalho |
“De andada no Alto, meu povo / Tem gente que anda de lado / Tem gente que anda com Bíblia / Que anda com arma e que anda fardado / Sindicato nasce na esquina / Gente do bem vende a alma ao Diabo / Tem gente que anda com Bíblia / Que anda com arma e que anda fardado / “Respeito é pra quem tem” / Sabota falou tá falado / Tem gente que anda com Bíblia que anda com arma E que anda fardado”.
Com batida marcial de Celo Brown, a guitarra cortante de Neilton e esses versos atuais e contundentes de Cannibal, com direito a citação ao rapper paulistano Sabotage, que os Devotos rompem um silêncio de 6 anos desde o lançamento do álbum anterior – Póstumos (2012) – e mostram ao mundo O Fim Que Nunca Acaba.
Mesmo sem lançar disco nos últimos anos, a rapaziada do Recife não para de se movimentar, sempre em várias frentes! Comemorando 30 anos de carreira, recentemente se encerrou uma exposição em sua terra natal com trabalhos do guitarrista e artista plástico (dentre outras habilidades) Neilton Carvalho e Cannibal, além do seu trabalho com a banda de reggae Café Preto, está lançando seu primeiro livro “Música Para o Povo Que Não Ouve”, ao mesmo tempo em que o sétimo disco deles chega às ruas.
Voltando ao álbum, depois da punkada “De Andada” que abre o disco, “Fé Demais” é a sequência e mostra que os Devotos são uma banda de punk rock hardcore, mas que tem DNA próprio, nunca se limitou a ser uma cópia do que veio antes, seus timbres e discurso tem voz que é só deles. “Eu o Declaro Meu Inimigo” é uma porrada e tanto, e já era conhecida do público, por um belo clipe colaborativo lançado pela banda há 4 meses, confira aí o tamanho da bordoada:
O disco continua com “Dias de Vida”, que me remeteu ao disco de estreia deles (Agora Tá Valendo (1997) – quando os Devotos ainda eram “do Ódio”, e que teve turnê comemorativa de 20 anos de lançamento no ano passado). “DECIDA! RESISTA! INSISTA! A glória é a conquista”, é o grito de ordem da vez, na ótima faixa “D.R.I.”, que em minha opinião, tem tudo para ser hit do disco, juntamente com a faixa de abertura.
“Incrédulo” traz uma mudança de clima no álbum, o discurso continua contundente, mas a guitarra aqui tem um viés psicodélico e a faixa ainda conta com participações especiais de Maestro Forró, no trompete, fundador da Orquestra Popular da Bomba do Hemetério, ideia de reunir músicos do bairro popular do Recife, e misturar ritmos regionais com erudição e de J Five S, no sintetizador. Vale citar que a Bomba do Hemetério é onde mora o guitarrista Neilton Carvalho.
“Todos Lado a Lado” é porrada, pura e simples. Punk rock hardcore, sabe onde é que faz? Sim, é no Alto José do Pinho, e é do caralho! “Chama Padre Quevedo” tem mais participação do trompete de Maestro Forró e um violão que me lembrou de música flamenca, a cargo de Neilton, numa bela faixa. “Não Fico” é daquelas faixas onde Cannibal declama sua poesia sobre uma base forte, densa, soturna até, novamente com Celo fazendo uma batida marcial, e com Neilton solando bonito. Esta faixa é um perfeito pós-punk.
“Orar Sem Fé Não Abre Portas”, é um recado direto, curto e grosso. “Matou Morreu” vem na sequência e trás outra participação especial, e agora o amigo Carlão Underground dividindo vocais com Cannibal. O disco continua com “Periferia Fria”, uma balada reggae, de letra triste e forte, que trás uma dura realidade, onde Cannibal brada que “Tem aqueles que ajudam / Aqueles que unem / Aqueles que marcam / Tem aqueles que usam / Aqueles que abusam / Aqueles que escracham” e continua com “Ei! Não me faz ter dó / Você vacilou, você não é mais menor / O filho chora o pai que a mãe não deu / A mãe em prantos diz: - Seu pai sou eu”.
Caminhando para o final, “Te Dominou” segue a cartilha do PPP (Puta Punk Pernambucano), porrada direta e certeira. “Não Desista” é outra que traz um trabalho bacana de Neilton nos violões e do convidado J Five S nos sintetizadores. Finalizando este belo álbum, chega a faixa “Liga da Justiça”, outro reggae, com Maciel Salú na rabeca e segunda voz, artista de família conhecida no Recife, vindo dos velhos maracatus, ciranda, forró e rodas de coco, atualmente integra a Orquestra Contemporânea de Olinda.
Trinta anos de carreira e mais um disco empolgante, longe da mesmice, navegando por diversos mares, DEVOTOS mostram que ainda tem muita lenha a queimar no modorrento rock mainstream de 2018. Independentes e contundentes, discípulos diretos do Faça Você Mesmo, mas façam bem feito, como é a praxe de Cannibal, Neilton e Celo Brown.
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