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Robô que simbolizou a edição de 20 anos do Porão do Rock [Foto: Bruno Eduardo] |
Por Bruno Eduardo
Basília ferveu. Amarrado à ebulição política de um momento pré-eleitoral, a edição comemorativa de vinte anos do Porão do Rock, um dos mais influentes festivais do país, merecia um capítulo a parte no livro História do Porão, obra do jornalista Pedro de Luna, em que ele descreve todo o percurso do festival de forma minuciosa, contando curiosidades e relatando fatos. O livro foi lançado juntamente com o evento e vendido na loja oficial nos dois dias.
Inserido às manifestações que aconteciam do lado de fora, o PDR 2018 (a vigésima primeira edição) acabou ganhando um valor ainda mais factual, já que boa parte dos artistas que subiram no palco, aderiram ao movimento das ruas com mensagens - principalmente nos dois palcos principais.
Mais uma vez hospedado no estacionamento do estádio Mané Garrincha, o Porão do Rock manteve sua tradição alternativa de juntar bandas de várias tribos distintas e contar com projetos relevantes - principalmente no que diz respeito à sustentabilidade. O apoio social também esteve presente no recolhimento de alimentos não-perecíveis, e, na incrível iniciativa de colocar um assistente de palco, que ficava ficava traduzindo na linguagem de libras, tudo o que era falado e cantado pelos artistas.
Estrutura e divisão dos palcos
Mesmo dividido em três palcos e com shows simultâneos, o Porão do Rock mostra-se mais eficiente que a maioria dos outros grandes festivais na proposta de apresentar os artistas ao público de forma geral. Quem gosta de ir para festivais assistir shows, pôde conferir quase tudo - ou um pouco de tudo - se quisesse. A ideia de separar um local exclusivamente para as bandas mais pesadas foi um acerto e tanto. Já que o "Palco Pesado", mais distante, acabou ficando ocupado por uma plateia específica durante todo o festival (maior um pouco no sábado).
Outro ponto positivo do PDR é que ele ainda não entrou na total gourmetização que assola os principais eventos de rock. Isso é algo que pouca gente fala, mas é importante por dar opções de escolhas mais econômicas ao público. Além dos já conhecidos foodtrucks, você conseguia encontrar pasteis, churros, pipoca, chocolates, entre outras coisas. Também haviam algumas opções para quem estivesse lá buscando outras atrações ao invés de shows apenas, como uma área de camarote e um bungee jumping para os aventureiros.
Vamos falar dos shows?
Ao todo, foram 46 shows. Nos dois dias de festival, predominância de bandas locais e muitas atrações cariocas. O metal ganhou seu espaço com bons shows de nomes já conhecidos (Krisiun e Korzus) e outros que fagulham na cena como novos expoentes (como a boa Device). Por tratar-se de um evento que engloba cenas locais, o que não faltaram foram as chamadas "participações especiais". E isso aconteceu nos três palcos. A de maior destaque foi a presença de BNegão no show da Nação Zumbi. Mas o legal mesmo é ver bandas de futuro promissor como Desonra, Metamoros e Lupa tendo oportunidade em uma grande arena. Abaixo destacamos algumas apresentações dessa edição de 20 anos do histórico Porão Do Rock.
Drenna e as mulheres na linha de frente
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Drenna agitando no Porão do Rock [Foto: Bruno Eduardo] |
A primeira banda que despertou interesse do público - que ainda chegava - foi a Drenna. O quarteto já possui experiência em grandes palcos, e fez uma apresentação concisa. Com repertório baseado em seu último disco, Desconectar (2016), eles foram - curiosamente - a única banda do festival (das novas) com a proposta de fazer rock alternativo apoiado em refrões. "Anônimo", "Entorpecer" e "Desconectar", mantiveram a galera ligada no show. Houve também um momento de apoio às mulheres antes de "Ela Vai Chamar Sua Atenção" e participações especial de Maurício Kyann, da banda carioca Nove Zero Nove e Maurílio Fernandes da banda Rocca, que botaram fogo no palco.
Banda paulista resgata rock 90's
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Deb Babilônia levando visual retrô ao Porão [Foto: Bruno Eduardo] |
A presença do Deb And The Mentals no Porão do Rock foi como um frescor para os fãs de rock garageiro nostálgico. Com um som calcado no garage rock das bandas surgidas em Seattle no fim dos anos oitenta, o grupo paulistano segue divulgando seu último trabalho, o ótimo Mess, lançado no ano passado. Músicas como "Alive" e "I'm Ok" representam perfeitamente a cartilha sonora do grupo, que liderado pela simpática Deb Babilônia, deu seu recado da melhor maneira possível.
Porque não há nada parecido...
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Angelo Arede agitando com o Gangrena [Foto: Bruno Eduardo] |
Impossível qualquer pessoa ficar ilesa a um show da Gangrena Gasosa. Não é de hoje que a apresentação da banda gera todos os tipos de reações do público. Mas é importante ressaltar que a presença de palco do grupo é sempre um destaque, gerando comoção dos fãs, que cantam junto canções como "Quem Gosta de Iron Maiden Também Gosta de KLB" e "Eu Não Entendi Matrix" e fazem roda nas pancadas desenfreadas do repertório ("Fiscal de Cu", "Carnossauro Diet", "Gente Ruim").
O discurso atemporal do Pavilhão 9
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Doze deu seu recado com o Pavilhão 9 [Foto: Bruno Eduardo] |
Como é bom ainda ver o Pavilhão 9 em ativa nos dias de hoje. Afinal, eles são um dos principais representantes da cena nacional nos anos noventa e tiveram um papel importante ao misturar o rock pesado e o rap de forma tão genuína. O show do Porão é forte e o impacto que canções do quilate de "Vai Explodir" - parceria com Black Allien - comprovam a relevância do grupo na história. A apresentação seguiu de forma impetuosa, valendo inclusive uma referência a Bob Marley em "Get Up Stand Up". Do novo disco (Antes, Durantes, Depois), primeiro em onze anos, destaque para a ótima "Tudo Por Dinheiro".
A Braza ferveu no Porão do Rock 2018
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Pedro Lobo é um dos trunfos no som do Braza [Foto: Bruno Eduardo] |
No início do ano, tive a oportunidade de conhecer o Braza no festival Lollapalooza. Se ninguém contar, você não acredita que esses garotos são remanescentes do ForFun, um dos principais representantes da cena emo carioca, que apareceu de forma epidêmica no início dos anos 2000. Mas mudando completamente de idioma musical, o Braza impressiona pela capacidade de passear por melodias, juntar referências (pop, soul, groove, reggae) e construir canções de extremo bom gosto. Com repertório tirado de seus dois ótimos trabalhos (Tijolo Por Tijolo e Braza), eles deram um baile de presente para a galera que parou para assistir e dançar.
Plebe Rude, Brasília e rock and roll
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Clemente apoiado sobre a caixa de retorno [Foto: Bruno Eduardo] |
Assistir um show da Plebe Rude em Brasília, num festival clássico, em momento político efervescente é quase que um convite à história do rock nacional. Principalmente neste show, que faz parte da turnê de seu mais novo trabalho, batizado de "Primórdios", que resgata várias canções inéditas compostas pela banda antes do primeiro disco (O Concreto Já Rachou, de 1986). A dupla Clemente / Seabra botou o povo pra cantar e dançar ao som de "Johnny Vai à Guerra", "Voz do Brasil" e do hino "Até Quando Esperar".
Porão do Hip Hop com Froid
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Froid trouxe batidas ao Porão do Rock 2018 [Foto: Bruno Eduardo] |
Impressionante a hype em cima do Froid. O rapper brasileiro veio acompanhado de uma ótima banda, com destaque para os duetos vocais com a carismática Cynthia Luz. O show do Froid é tomado essencialmente pelas bases do hip hop, só que há fortes inclusões de pop e eletrônico. Detalhe: entre tantos shows de rock, foi nesse que tivemos o único solo de bateria do dia.
O Punk raiz que vem de Recife
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Neilton à frente do Devotos no show do Porão [Foto: Bruno Eduardo] |
Comemorando trinta anos de carreira, o Devotos chegou no Porão do Rock para apresentar seu mais novo disco, O Fim Que Nunca Acaba, sétimo trabalho da carreira [leia a resenha AQUI]. O mais legal da apresentação deste ícone da cena pernambucana é a manutenção da origem underground. São apenas três caras em cima do palco fazendo punk rock de forma honesta. É uma relação tão veraz, que os caras não se preocupam com nada além de fazer seu som, do jeito mais simplório e espontâneo. Mais raiz impossível.
O Melhor do hardcore com o Cadibóde
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Bolhão no ótimo show do Cadibode [Foto: Bruno Eduardo] |
A força do hardcore sempre dominou Brasília. E neste Porão, quem melhor representou isso foi a ótima Cadibóbe. O grupo é muito bom de palco e desenhou a apresentação de forma perfeita. Além de pancadas padrões para o gênero, como "Cruz Credo", "Cheiracolagem" e "Zé Intriga", eles souberam aproveitar muito bem o telão, com animações para cada música do repertório. Destaque para o vocal de Bolhão - que foi pogar no meio da galera - e para as letras bem sacadas de "Minha irmã é mesmo o Bob Marley" e "Esquisito Suado". Quem puder, confira!
D.F.C. comprova representatividade histórica
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Pulo do vocalista Túlio no show do D.F.C no Porão [Foto: Bruno Eduardo] |
Com 25 anos de carreira, o D.F.C. é uma das bandas mais respeitadas da cena hardcore nacional. E não teria como a edição de 20 anos do maior festival de Brasília não ter um de seus principais filhos. Talvez por isso, o show dos caras foi um dos que melhor representaram o clima de pogo que o palco metal recebeu este ano. Com um repertório honesto, eles enfileiraram pancadas sem pausa para descanso, com destaque a ótima homenagem de Tulio aos nossos políticos em "Todos Eles Te Odeiam".
Excentricidade bilíngue
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Francisco El Hombre agitou a galera no domingo [Foto: Porão do Rock] |
O Francisco El Hombre é daquelas bandas que fazem muito mais sentido em cima do palco. Para quem não sabe, o grupo foi formado pelos irmãos Sebastián e Mateo Piracés-Ugarte, dois mexicanos naturalizados brasileiros e ganhou maior notoriedade ao ser indicada ao Grammy Latino do ano passado. Por toda a questão artística envolvida, e pela energia que eles colocam nas performances, a banda chama atenção no palco pela excentricidade. As músicas da banda passa pelo folk, música mexicana e rock. E tudo funciona. Tanto que foi uma das bandas mais festejadas pelo público de domingo.
A Estreia do Barão...
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Guitarras afiadas: Rodrigo Suricato e Fernando Magalhães [Foto: Bruno Eduardo] |
Teria que ser mesmo numa edição especial. A primeira vez do Barão Vermelho no Porão do Rock foi em grande estilo. Com o melhor som do festival, a banda que agora conta com Rodrigo Suricato fez uma apresentação impecável, principalmente pela qualidade de seu repertório, que conta com uma invejável coleção de hits. "Meus bons amigos", "Mais uma dose" e a não tão batida, "Cuidado", serviram para lavar a alma dos roqueiros. Assim como também não faltaram as baladinhas cheias de violões ("Por você") e declarações de amor ("Exagerado"). Destaque para a voz de Suricato, com timbre similar a Frejat e para o guitarrista Fernando Magalhães, que é um show à parte.
E a Despedida do Matanza!
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Jimmy em show de muitos agradecimentos [Foto: Bruno Eduardo] |
Na justíssima posição de fechar o Porão do Rock, o Matanza apresentou o seu suposto de show despedida do festival. A banda anunciou que essa será a sua última turnê juntos e que depois disso, cada um vai seguir o seu caminho. Mesmo que nas entrevistas recentes, eles passem a impressão de problemas de convivência, no palco tudo parece soar no clima de paz. "Lembro de quando estivemos aqui lançando um CD em 2006", disse Jimmy, trazendo à memória sua segunda participação no festival (a primeira foi em 2001). No entanto, pouca coisa mudou quando o assunto é show do Matanza. A banda continua fazendo uma apresentação divertida, com muitas rodas de pogo, hits em cantoria e riffs de guitarra dominantes. No final, uma chuva fina veio abençoar a versão sempre catártica de "Ela Roubou Meu Caminhão".
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